terça-feira, 23 de junho de 2015

Precisamos uns dos outros

A Reforma Protestante foi, sem dúvida, uma das mais grandiosas provas do amor de Deus para com o Seu povo em todos os tempos. A redescoberta das Sagradas Escrituras, o renascimento da doutrina da salvação pela graça mediante a fé, o retorno da suficiência de Cristo e o renovado entendimento acerca da glória de Deus trouxeram luz numa era de trevas, marcada pelo domínio tirânico do papado. Os chamados “Cinco Solas” foram uma acertada síntese de tudo que a Noiva do Cordeiro mais necessitava para recuperar sua saúde espiritual. Naturalmente, os reformadores divergiam entre si em alguns pontos teológicos secundários, mas existia unidade no que tange às questões fundamentais. 

Porém, logo na geração seguinte, as divergências teológicas passaram a ganhar uma importância desproporcional. Disputas em torno de detalhes como a presença do corpo físico de Cristo na Ceia ou a doutrina da predestinação levaram os irmãos a dividir-se como se fossem rivais. No Século XVII, os puritanos britânicos e os pietistas de língua alemã sofreram forte oposição dentro de suas próprias igrejas (Anglicana e Luterana, respectivamente). Os pentecostais foram vistos com antipatia pelos cessacionalistas no Século XX. E hoje, nas redes sociais, é comum a troca de insultos e provocações entre calvinistas e arminianos, como se o Evangelho fosse propriedade exclusiva de um grupo somente. 

A Bíblia exorta-nos, sim, a zelarmos pela sã doutrina e a não misturarmos nosso culto ao Senhor com a adoração aos ídolos. O significado prático disso se resume em três pontos: primeiro, a fé cristã não compactua com formas de religião que rejeitam o senhorio de Jesus Cristo (budismo, islamismo, judaísmo, etc); segundo, nossa fé não admite um “cristianismo mesclado”, seja com a palavra do homem (catolicismo romano, adventistas do sétimo dia, testemunhas de Jeová, etc) ou com religiões obviamente não cristãs (espiritismo afro-brasileiro, espiritismo kardecista, etc); terceiro, não admitimos um “cristianismo” maculado pelos valores mundanos (liberalismo teológico, teologia da prosperidade). Decerto não deixaremos de amar, respeitar e conviver com as pessoas adeptas de tais crenças; só não podemos, de maneira nenhuma, incorporar a religiosidade delas à nossa fé. 

O problema é que muitos confundem zelo doutrinário com o desprezo aos irmãos em Cristo que pensam diferente. Servos do Senhor, verdadeiramente convertidos e genuinamente transformados pelo poder de Deus, são deixados de lado, simplesmente por terem opiniões diversas a respeito da idade certa para o batismo, a contemporaneidade ou não de dons como o de línguas, a eleição dos salvos e outros temas. Cada grupo se isola do outro, e irmãos os quais passarão a eternidade juntos, chegam ao cúmulo de trocarem insultos e zombarem uns dos outros, por causa do orgulho presente em seus corações. Isso é pecado e ofende ao Senhor, além de contribuir para o enfraquecimento da Igreja Cristã, por quem o Filho de Deus morreu na cruz. Que loucura, pensar que os membros de outras denominações – tão cristãs quanto a nossa – não têm nada a nos ensinar! 

Na verdade temos muito a aprender uns com os outros e precisamos viver em comunhão. Cada igreja mantém um entendimento parcial do Evangelho e nossa tendência é focarmos numa só doutrina bíblica, justamente por não assimilarmos todas as verdades expressas nas Escrituras. Alguns, priorizando o estudo bíblico e a correta exegese, negligenciam o conhecimento experiencial de Deus. Outros, dedicadíssimos à oração, não estudam a Bíblia com profundidade. Existem os que vivenciam o agir sobrenatural do Senhor com frequência, mas, supervalorizando as experiências, acabam por dar ouvidos ao que não deviam. E há irmãos muitíssimo hábeis em detectar uma heresia, porém, diante de uma situação de sofrimento, não se permitem clamar fervorosamente pelo socorro do Senhor. Qual dos filhos de Deus possui uma compreensão perfeita do cristianismo, e qual mantém uma visão cem por cento equivocada? A resposta, logicamente, é: nenhum. 

A história comprova que os períodos mais produtivos da Igreja, aqueles nos quais as bênçãos espirituais foram mais abundantes e o agir de Deus, mais claramente manifesto, coincidem com as épocas em que os crentes autênticos se uniram. Nos tempos apostólicos, quando “era um o coração e a alma” dos cristãos; na Reforma Protestante, que uniu multidões em torno das doutrinas centrais da fé cristã; ou nos Grandes Avivamentos do Século XVIII, tempo em que o importante era converter-se e viver uma vida de santidade; em todas aquelas ocasiões, as vaidades pessoais caíram e o testemunho do povo de Cristo foi notório. Por isso, nós, que somos a Igreja de hoje, precisamos nos arrepender, mudarmos nossa postura e nos unirmos outra vez, valorizando o essencial do Evangelho e respeitando nossas diferenças, que não precisam desaparecer para vivermos como irmãos. Certamente o Todo-Poderoso espera isso de nós. Que Ele nos ajude a colocarmos em prática!

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